sexta-feira, janeiro 15, 2010

Filha de Dener em entrevista exclusiva para o Degradê da Moda

Dener, em famosa foto que faz parte de sua autobiografia "Dener, o Luxo" (Ed. Cosac y Naif)

Ele é considerado, e fazia questão de se intitular, o fundador da moda brasileira. Talentoso, polêmico e sem ‘papas na língua’, o estilista Dener Pamplona de Abreu construiu uma carreira glamourosa, fazendo o Brasil dos anos 50 e 60 respirar a alta-costura, inspirada na Paris de Balenciaga e Coco Chanel. Acabou atropelado pelo prêt-a-porter trazido por nomes como Yves Saint Laurent, o que o entristeceu muito.
Além de estilista, Dener tinha uma personalidade forte e um jeito escrachado de criticar e polemizar. Em razão disso acabou fazendo sucesso na televisão, apresentando programas de auditório e participando do júri de Flávio Cavalcante ao lado de nomes como Elke Maravilha e Danuza Leão (para quem desenhou o vestido de seus 15 anos).
Infelizmente, como muitos dos nossos ídolos, Dener morreu cedo, em 1978, aos 41 anos. Porém, deixou uma carreira bonita, essencial e marcante na história da moda brasileira. Para resgatar um pouco da vida desse ícone da moda, o Degradê entrevistou a pequena empresária Maria Leopoldina Splendore Pamplona de Abreu, a filha de Dener. Aos 42 anos e residindo atualmente em Pindamonhangaba-SP, ela é detentora da maior parte do acervo do estilista e já leiloou alguns de seus croquis originais. Na entrevista, Maria Leopoldina responde a questões polêmicas sobre a personalidade de Dener e sobre sua paternidade (por várias décadas a mídia abordou que o verdadeiro pai da empresária seria o cantor Roberto Carlos). Confira:

Dener com as manequins de seu atelier

Degradê da Moda – Dener era aquele furacão de talento e irreverência, mas por outro lado ele conta, em sua autobiografia, que no fundo era um cara muito sério. Até que ponto essa “introspecção” ajudava em seu processo criativo?
Maria Leopoldina - Na minha opinião, meu pai era um "gênio" e as pessoas equipadas com esse requisito cármico podem muito!
DM – Você vai leiloar os croquis de Dener?
ML - Já aconteceram dois leilões, um foi no leiloeiro Emerson. Todas as peças têm o mesmo valor e são croquis originais assinados e com mais de 35 anos. Haverá mais um leilão marcado, mas ainda preciso confirmar algumas informações.
DM – Oficialmente seu pai é Dener Pamplona de Abreu. Entretanto, há pessoas que garantem, como o falecido apresentador Carlos Imperial, que Roberto Carlos seria seu pai biológico. Como você lida com essa história?
ML - Esta história sempre fez parte da minha vida, desde que nasci. Meu pai é o Dener, foi quem me registrou, me amou e me criou. Quanto ao Roberto Carlos ... gosto de algumas musicas dele!  Teria muito orgulho de ser irmã do filho dele. Acho o Dudu Braga (apresentador de TV) o máximo.

Casamento de Dener com a modelo Maria Stella Splendore

DM – Dener nasceu em Soure, um pequeno município, no arquipélago do Marajó, no Pará e pouca gente sabe disso. Você conhece ou chegou a conhecer esse lugar? Teve ou tem contato com as raízes familiares de Dener, parentes, etc?
ML - Agora não mais. Tinha contato com minha tia Dora e minha avó Lolita apenas.
DM – Dener fazia questão de, sempre que tinha oportunidade, alfinetar outro estilista, seu famoso rival Clodovil Hernandes. Ele compartilhava essa rivalidade com você? No fundo, Dener acreditava mesmo que “Clô” copiava seus modelos?
ML - Não acho que ele fazia questão de alfinetar os outros estilistas, meu pai era uma pessoa que dizia tudo o que pensava. Ele também dizia coisas que todo mundo pensava, mas não tinham coragem de dizer. Herdei isso dele, também sou assim. Não acho que Clodovil era seu rival, meu pai tinha um estilo próprio em tudo que fazia e inclusive em sua vida pessoal.

O estilista fotografado ao lado de seu 'rival' Clodovil

DM – Com Dener, as mulheres mais famosas e ricas do Brasil aprenderam a ser chiques e elegantes. Mas o que elas não aprenderam com o costureiro e somente quem conviveu na intimidade dele absorveu?
ML - Meu pai criou um enorme palco e realmente viveu em cima dele. Tudo que ele representava ali era real. Ele era "aquilo" mesmo.
DM – Uma noite, por acaso, liguei a TV e, para minha surpresa, o Programa Amaury Jr. mostrou uma entrevista que o apresentador fez com você em 1985, durante uma recepção. Na ocasião, você dizia que sua mãe havia aderido ao movimento Hare Krishna e você própria, aos 17 anos, também o havia experimentado, mas que ainda não era o momento de aderir por completo àquela filosofia. Você mudou de idéia? Por quê?
ML - Quando somos jovens e entramos em uma determinada religião que diz que devemos seguir princípios, e que o mundo material é ilusório, que as pessoas em geral estão iludidas por Maya (a Deusa da ilusão), como adolescentes curiosos queremos saber como é este tal mundo material "proibido". Isso acontece muito no movimento para a consciência de Krishna com crianças e adolescentes que nasceram no movimento.
Tirei tudo o que pude de bom e de ruim deste "tal" mundo, e depois de ter dado muitas voltas acabei outra vez rendendo-me à Krishna. Porém, hoje moro na minha casa com minhas filhas e neto, tenho uma vida absolutamente normal, só que sou vegetariana, estudo os vedas, e adoro Krishna (Deus) no meu coração, na minha casa, de forma individual. Todas as organizações e corporações têm pessoas boas e ruins, no caso da Iskcon (corporação que eu seguia) também é assim. Depois que Sua Santidade Srila Phabhupada, fundador da Iskcon no Ocidente, faleceu (há 32 anos) infelizmente pessoas não qualificadas tomaram o poder, o que fez com que esta organização se tornasse "não confiável". Tudo que acontece em outras organizações acontece lá também: pedofilia, corrupção, guerra de poder, "muitos falsos seguidores" que estão somente atrás de fama, dinheiro, luxuria, etc. e não atrás de evolução espiritual. Por isso, digo às pessoas que procuram os "Hare Krishnas" que tomem muito cuidado. A filosofia é incrível, Krishna é Deus, SS. S. Prabhupada é o Guru fidedigno autêntico, mas as corporações às vezes não são idôneas.

Devota: Maria Leopoldina em traje hindu

DM – Um antigo sócio de Dener ainda reside na casa onde o estilista viveu. Esse sócio tem vários objetos e obras do costureiro, que recentemente foram expostos em Brasília. Grande parte do acervo de Dener ainda está com a família Pamplona de Abreu?
ML - Bom, primeiro este rapaz que você se refere, nunca foi sócio de Dener, foi um funcionário por algum tempo. Segundo, esse rapaz como muitas outras pessoas é um fã fiel a Dener. Quanto a ele morar na casa que foi de meu pai esta era alugada e nunca foi de meu pai. Ele a comprou porque como todos os fãs queria ter algo que lembrasse meu pai. O acervo que ele tem, a maioria comprou de meu falecido irmão, outras coisas arrecadou com antigas clientes de meu pai. Eu pessoalmente tenho uma parte do acervo de Dener, e sou proprietária única e absoluta do nome Dener.
DM – Dener era polêmico, ousado e talentoso. Dizia que inventou a moda no Brasil. Você concorda com ele?
ML - Claro que sim! As mulheres de alta classe e milionárias não compravam roupas no Brasil antes de Dener.
DM – Requinte, riqueza, luxo, tudo isso fazia parte da vida de Dener. Celebridades viviam em sua casa. O que você recorda e avalia desse tempo de glamour, vivido ao lado de seu pai?
ML - Infelizmente, não me recordo! Quando meu pai faleceu eu tinha 12 anos.

Dener com a esposa Maria Stella e os filhos Frederico e Maria Leopoldina, recém-nascida


Maria Stella, que aderiu ao movimento Hare Krishina, e os filhos já adultos

DM – Dener amava a alta costura; por isso devotava “ódio mortal” a Yves Saint Laurent, precursor do Prêt-a-Porter. Ele compartilhava esse “ódio” com você e o restante da família? E se estivesse vivo fisicamente nos dias de hoje (pois como criador de moda Dener é imortal), ele conseguiria se adaptar à indústria cultural-mercantilista-capitalista-imediatista e comercial que é o mundo da moda neste começo de século XXI?
ML - Particularmente, nunca ouvi meu pai falar mal de ninguém, na verdade às vezes ele "tirava onda" com situações e pessoas, mas ódio não, nunca. Ele era um grande humorista entre outras coisas! Ele nunca se adaptaria a nada que não fosse criado por ele mesmo. Acho que se "matou" (com álcool) por isso, não suportava a idéia de indústria cultural-mercantilista-capitalista-imediatista e comercial, nem naquela época que isso era só rumores.
DM – Muitas das clientes de Dener acabaram se tornando suas amigas e o tinham como confidente. Uma delas, a estrelíssima Vivian Leigh, atriz de clássicos como “...E o vento levou” e “Um bonde chamado  desejo”, o procurou assim que desembarcou no Brasil e logo se tornou mais uma de suas fãs, adquirindo 12 de seus vestidos exclusivos. Dener comentou com você sobre essa amizade e mesmo a visita que Leigh fez à residência dele?
ML - Não, eu era só um bebê, mas conheço a história.

Dener e Maria Stella em recepção ao bilionário Sachs

DM – Como era o processo criativo de Dener? Ele era daquele tipo de artista que se isola em seu ateliê por muitas horas, ou a idéia surgia a qualquer momento ele anotava em algum lugar e depois desenvolvia o projeto?
ML - Ele sempre tinha canetas, lápis, papéis em todos os lugares da casa, fato que me fazia muito feliz. Às vezes estávamos assistindo TV, na cama dele e ele pegava um papel e desenhava, criava ou simplesmente rabiscava. Eu adorava isso! Sempre eu e meu irmão ficávamos pedindo desenhos disso e daquilo. Uma vez, pedi uma árvore de natal, então ele fez a árvore mais linda já vista por alguém. Ela tinha muitas bolas coloridas, bolas com rendas, bolas com desenhos dentro, estrelas, bichos, luzes coloridas, sinistra! Ele não anotava, ele já fazia, depois enchia de anotações, medidas, e as costureiras espetavam o desenho com alfinetes e pedacinhos de tecidos. Em seguida eu ou meu irmão assinávamos por ele, era uma briga horrível para assinar os croquis! Os croquis que tenho são assim na maioria, tenho muitos assinados por mim.
DM – Por conta de ter sido jurado no programa de Flávio Cavalcante, Dener tornou-se muito popular. No entanto, ele diz, em sua autobiografia que nunca pretendeu ser uma personalidade do “povão” e que fazia seus vestidos para quem pudesse pagar caro por eles. Como ele lidava com a fama? Ele criou um personagem para enfrentar o assédio?
ML - Ele sempre dizia que não tinha medo de nada na vida, só do estouro da boiada! É quando o povo sai correndo para cima do ídolo, ou impedem o carro de se mover, mas ele gostava disso sim, ele era uma pessoa super bondosa e caridosa, sempre ajudava pessoas humildes, embora parecesse contrário.

Dedicação à religião e à família: Maria Leopoldina, em foto atual, com o netinho Francisco.


Herdeiros de Dener: Maria Leopoldina e sua família

DM – Para finalizar, qual a lembrança mais marcante que Dener deixou impregnada em sua memória?
ML - Não existe "lembrança mais marcante". Tudo que vi, ouvi e vivi com meu pai foi muito bom e marcante para mim. Pena que se foi tão cedo!

Fotos: Acervo pessoal e Divulgação

10 comentários:

Silvana Saldanha disse...

Ju,
Parabéns,querida! Que maravilha a entrevista que resgata a história desta personalidade que tanto nos enche de orgulho. Vou linkar no "forfriends", ok?
Beijos,
Sil.

Heslei disse...

Gostei da entrevista! Muito bem feita! Parabéns.

Jumara Cardoso disse...

Obrigada, queridos! O papel do Degradê da Moda é sempre levar a melhor informação. Qualidade é nosso objetivo.
Sil, obrigada por linkar a entrevista. Fico feliz. Bjs a todos!!

Anônimo disse...

Muito boa a entrevista com a Maria
Leopoldina. Sou fã do Dener desde a
minha adolescência e fico feliz quando reconhecem a importência que ele teve na moda brasileira.
Parabens!
Enaide Lazarini
Piracicaba-SP

Jumara Cardoso disse...

Muito obrigada Enaide. O Degradê da Moda e eu, particularmente, somos também fãs de Dener Pamplona de Abreu e reconhecemos toda a sua importância para a história da moda brasileira.

hilda disse...

Lembro-me vagamente do Dener. Infelizmente o Clô viveu mais. Acho q ele forçava a barra p ser como Dener. Achei a matéria por acaso, mas amei a entrevista e as fotos. UM LUXO!

Jumara Cardoso disse...

Oi Hilda, obrigada! É bom poder contar com a sua visita, embora no momento eu não tenha tido tempo para postar mais novidades. Há muitas opiniões sobre o Dener e todas merecem ser respeitadas. O propósito do blog é esse mesmo, lançar as informações para que os leitores possam refletir sobre elas.
Apareça mais vezes. Beijos !

Unknown disse...

A foto que diz que é Maria Leopoldina com seu neto Francisco não é ela, sou eu Mariana, filha dela, com meu filho.

Unknown disse...

Ola Jumara, a foto que diz que Maria Leopoldina com seu netinho Francisco nao é ela, sou eu Mariana, filha dela, com meu filho .

Unknown disse...

A foto que diz que é Maria Leopoldina com seu neto Francisco não é ela, sou eu Mariana, filha dela, com meu filho.

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